quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Putz...caralho!

"Todas as formas de relacionamento íntimo atualmente em voga portam a mesma máscara de falsa
felicidade que foi usada pelo amor conjugal e mais tarde pelo amor livre... Ao olharmos mais de perto e
afastarmos a máscara, descobrimos anseios não-realizados, nervos em frangalhos, amores frustrados,
sofrimentos, medos, solidão, hipocrisia, egoísmo e compulsão à repetição... As performances substituíram
o êxtase, o físico está por dentro, a metafísica, por fora... A abstinência, a monogamia e a promiscuidade
estão todas igualmente distantes da livre vida da sensualidade que nenhum de nós conhece."

(Zygmunt Bauman - Amor líquido)

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Lua vazia

Por que tem que ser assim?

qualquer pessoa com o mínimo de sobriedade sabe que se existe alguma chance de satisfação plena, para não usar a palavra felicidade, só será alcançada nesta vida. O satisfatório virou uma conformidade muito mediana, muito abaixo do que se deveria aspirar. Aspirar dias melhores. Aspirar uma plenitude de alegria. Por que o que desejamos está sempre ao alcance das mãos, porém impossível de ser agarrado? Por que essa tortura, essa espera corrosiva de realização? A esperança é uma perdição. Esperar por essas experiências plenas, esperar que sejam eternas, parece ser uma brincadeira leviana dos deuses para com os reles mortais desejantes aqui. É nosso inferninho.

A cada dia vou ficando mais cansado. Meu corpo vai se transformando... já apresento uma calvície avançada, uma lordose e curvatura de coleóptero... também já possuo uma casca ressequida, uma hálito ácido e uma pancinha pochete a lá titio. Há muito possuo um ritmo adágio no meu caminhar e uma preguicinha com certos programinhas adolescentes. Confesso também que já me canso de noitadas predatórias intermináveis... e já me disseram que meu sorriso está mais raro e que minhas olheiras vieram pra ficar. Me sinto mais reacionário, mais acomodado em minhas convicções e aspirações.

Inversamente proporcional a essa "queda de Adão", minha libido e apetite sexual aumentaram. Mas não diria isso com relação à iniciativa de correr atrás e fazer loucuras de amor na captura ou na cama. Me transformei em um indivíduo mais administrado e mais administrável.

Caminho sem volta? Tem que ser assim?

Há uma frase de Beckett em "Dias Felizes" que é mais ou menos assim: "Não que eu tenha ilusões, mas alguma coisa precisa mudar no mundo" .
Eu pediria uma licença poética ao Beckett e reescreveria assim:
Não que eu tenha ilusões, mas alguma coisa precisa mudar em mim.

Dias felizes?
Haha!
Até agora, não pra mim.
Mesmo que eu aspire e des-espere por isso todos os dias...
Vamos ver no que damos...veremos...

Será que um dia vou ficar com aquela culpa de “ah..eu era feliz e não sabia?”
Minha conclusão é que não sei. Não saibo. Não caibo.

Netuno está alinhado com o sol. E a lua está vazia.
Subjetividade em luta com a objetividade.
Situação perfeita para os desatinos.

- Delicioso lugar...
- Perspectivas risonhas
(Esperando Godot – Beckett)

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

sábado, 7 de agosto de 2010

Qual o sentido desse blog? "Preservar e abrir espaço"

Quase ninguém lê esse blog. Não é um fato exclusivo desse mas de quase todos blogs. Esse blog pra mim serve como um depósito. Sou como uma topeira. Um animal subterrâneo que se esconde no escuro e que junta coisas em sua toca. Aliás, acredito que o animal humano esteja mais para esse tipo de mamífero roedor, que escava e junta coisas no subsolo, do que outra coisa. Ironicamente as pesquisas científicas utilizam cobaias roedores para a descoberta de soluções de doenças e comportamentos humanos porque essas criaturas são as que tem o metabolismo mais parecido com o nosso. E também porque o rato é  mais descartável que o macaco...

Sendo assim o blog é uma reunião de coisas que vou postando, listando. Coisas que me emocionaram ou que achei interessante. Ele é um depositário de minha memória,pra depois eu mesmo ler e lembrar. Ele também pode ser um campo de batalha, lugar onde eu exercitarei e depositarei meu ato criativo, um poemacto. Devo dizer que me incomoda esse aspecto intimista do blog, essa voz em primeira pessoa, esse "meu espaço". Vivemos hoje uma hipervalorização da intimidade. Confesso que sinto náuseas todas as vezes que vejo isso nas galerias, na literatura, na internet e no teatro. As pessoas da geração de meus pais - os artistas e ativistas da geração de 68 - estavam ocupados com o enfretamento do mundo e não com essa coisa ambrosiana, frágil, fracionária da esfera intimista.

Deixo aqui um trecho de "As Cidades Invisíveis", de Italo Calvino que me emocionou muito. Diz sobre o sentido da arte. Mas do que isso, fala sobre uma vocação humana para o séc XXI:

"O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte dele até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizado contínuos: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.”

(Ítalo Calvino in “As Cidades Invisíveis”)