sábado, 10 de março de 2012

A caverna dos sonhos esquecidos

Após assistir o último filme de Werner Herzog "A caverna do sonhos esquecidos"

“Por que o nascimento da arte esteve ligado a uma expedição subterranea?
Por que a arte foi e permanece um sombria aventura?
A arte visual apresentaria um laço com os sonhos, que são eles também visões noturnas?
Vinte e mil anos se passaram: no final do sec XIX a humanidade veio em massa se enterrar e se algomerar nas salas escuras da cinematografia, das camaras de concerto, das salas de teatro.
Por que todos os santuários começam onde a luz do dia como a  claridade astral cessam de ser perceptíveis, ali onde a escuridão e a profundidade oculta da terra reinam absolutas?
Por que seria preciso esconder essas imagens (que não são imagens, que a cada vez foram visões, phantasmata, que só surgiram semivisíveis com a  ajuda da chama trêmula que repousava na gordura do animal abatido) no escondido da terra?
Por que o pensamento de bisões e de cabritos “fugiu” no momento do recuo das geleiras?
Apresento a especulação própria a esse pequeno tratado na seguinte forma: essas cavernas não são santuários de imagens.
Afirmo que as grutas paleolíticas são instrumentos musicais cujos muros foram decorados.
As pinturas rupestres começam onde cessamos de ver a mão diante do nosso rosto.
Ali onde vemos a cor negra.
O eco é o guia e a referência na escuridão silenciosa onde eles penetram e onde eles buscam as imagens.
O eco é a voz do invisível. Os vivos não veêm os mortos à luz do dia. Enquanto eles os veêm à noite nos sonhos. No eco, o emissor não é encontrado. É o esconde-esconde entre o visível e o audível.
Os primeiros homens pintaram suas visiones nocturnae deixando-se guiar pelas propriedades acústicas de certas paredes.
À luz da lâmpada de gordura, que descobria uma a uma as epifanias bestiais cercadas de sombra, respondiam as músicas litofônicas de calcita.”
(Pascal Quignard)

segunda-feira, 5 de março de 2012

Aquilo levanta-se. O quê? Sim. Dizer que se levanta e fica de pé. Teve de se levantar por fim e ficar de pé. Dizer ossos. Ossos nenhuns mas dizer ossos. Dizer chão. Chão nenhum mas dizer chão. De modo a dizer dor. Mente nenhuma e haver dor? Dizer que sim que os ossos podem doer até não haver alternativa senão levantar. Dalgum modo levantar e ficar de pé. Ou melhor pior restos. Dizer restos de mente onde nenhuns para permitir a dor. Dor dos ossos até não haver alternativa senão levantar e ficar de pé. Dalgum modo levantar. Dalgum modo ficar de pé. Restos de mente onde nenhuns só para a dor poder haver. Aqui dos ossos. Outros exemplos se preciso for. De dor. Alívio de. Mudança de. Tudo desde sempre. Nunca outra coisa. Mas nunca tão falhada. Pior falhada. Com cuidado nunca pior falhada.  Luz obscura origem desconhecida. Sabe-se o mínimo. Não não se saber nada. Seria esperar de mais. Quando muito o mínimo dos mínimos. Maximamente menos que o mínimo dos mínimos.
Não haver alternativa senão ficar de pé. Dalgum modo levantar e ficar de pé. Dalgum modo ficar de pé. Ou isso ou gemer. O gemido que de longe tão longo vem. Não. Gemido nenhum. Dor simplesmente. Levantado simplesmente. Um tempo para tentar como. Tentar ver. Tentar dizer. Como a princípio esteve deitado. Depois de algum modo se ajoelhou. Pouco a pouco. E em diante a partir daí. Pouco a pouco. Até se levantar por fim. Não agora. Agora falhar melhor pior.  Um outro. Dizer um outro. Cabeça afundada em mãos paralisadas. Vértice vertical. Olhos cerrados. Sede de tudo. Embrionária de tudo.  Isto não tem futuro. Infelizmente tem. Tentar outra vez. Falhar outra vez. Falhar melhor. 
Melhor pior. Melhor caminhar. Caminhar parar. Parar sentar. Sentar deitar. Deitar dormir.  Dormir sonhar. Sonhar caminhar. 

The Death of Klinghoffer